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O rúgbi virou negócio no Brasil, e cresce rapidamente

Com o impulso de um grupo de ex-jogadores, o esporte começa a atrair investimentos no Brasil — num ritmo mais acelerado do que em qualquer outra modalidade

Arap, da Confederação Brasileira de Rugby: desde 2010, a lista de patrocinadores quadruplicou (Germano Lüders/EXAME)

Arap, da Confederação Brasileira de Rugby: desde 2010, a lista de patrocinadores quadruplicou (Germano Lüders/EXAME)

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Da Redação

Publicado em 3 de fevereiro de 2014 às 13h13.

São Paulo - Vestir a camisa da seleção é o auge da carreira de qualquer atleta. No caso do rúgbi brasileiro, porém, durante muito tempo estar entre os melhores envolveu pouco ou nenhum glamour. Para praticar o esporte, além de suar a camisa, os jogadores bancavam cada centavo do próprio bolso — dos uniformes ao transporte nos dias de jogo. Para enfrentar rivais, viajavam até 15 horas de ônibus.

É uma história que o advogado Sami Arap, de 49 anos, conhece bem. Jogador na época da faculdade, ele chegou a ser capitão da seleção brasileira. Mas, sem perspectiva de ganhar a vida assim, montou o próprio escritório de advocacia. Agora, duas décadas mais tarde, voltou a se dedicar ao rúgbi sem ganhar nada por isso.

A diferença é que, desta vez, sua meta é mudar a realidade do esporte. O esforço começou em 2010, quando ajudou a profissionalizar a confederação brasileira. “Se pensasse duas vezes, não teria feito nada. Mas a vontade de ver o rúgbi dar certo falou mais alto”, diz Arap, presidente da Confederação Brasileira de Rugby.

À frente de um grupo de ex-jogadores engajados, Arap vem conduzindo uma guinada do esporte no país. O orçamento saltou de 30 000, em 2010, para 12 milhões de reais, em 2013. Neste ano, deverá chegar a 17 milhões de reais — o mesmo do handebol, que levou três décadas para atingir esse patamar e acaba de conquistar um feito histórico: o time feminino venceu o último campeo­nato mundial.

A lista de patrocinadores do rúgbi quadruplicou para 17 empresas, como o banco Bradesco e a fabricante de bens de consumo Unilever, que vai montar o primeiro centro de formação de atletas da modalidade, para até 100 jovens de 15 a 19 anos.

O objetivo é que dali saiam jogadores para representar o país em 2016, no Rio de Janeiro, quando o esporte voltará a figurar na Olimpíada após 80 anos de ausência. “Nenhuma outra confederação teve uma ascensão tão fulminante no Brasil”, afirma Marcus Vinicius Freire, diretor executivo de esportes do Comitê Olímpico Brasileiro.

Atrair a atenção para o rúgbi não é algo simples. Embora sua trajetória seja tão antiga quanto a do futebol, o esporte ocupa apenas a 15a posição entre os mais populares do país.

A versão mais aceita diz que o paulista Charles Miller, filho de um imigrante escocês, trouxe uma bola de futebol e outra de rúgbi de sua temporada na Inglaterra em 1894 e fundou os primeiros times das duas modalidades no São Paulo Athletic Club (Spac), que existem até hoje. Desde então o Brasil virou o país do futebol — e o rúgbi continua restrito a um punhado de aficionados. 


Mesmo assim, Arap acreditou que poderia usar a experiência que ele e alguns ex-colegas de campo tinham adquirido em negócios para virar o cenário. O primeiro passo foi formalizar o esporte, até então sem vínculo com o Ministério do Esporte. Criou-se um conselho, presidido por Eduardo Mufarej, sócio do fundo de private equity Tarpon e ex-jogador de rúbgi nos tempos de escola.

Jean-Marc Etlin, vice-presidente do banco Itaú BBA, que fez parte da seleção brasileira, tornou-se vice. Munidos de uma pesquisa da consultoria Deloitte, em que o rúgbi encabeça a lista de modalidades cuja base de fãs mais deve crescer, o grupo vendeu a imagem de um investimento promissor.

Marcas que já bancavam o esporte em outros países foram as primeiras convertidas, como a cervejaria Heineken e a Alpargatas, dona da marca Topper, fornecedora oficial dos uniformes. “O profissionalismo da equipe nos deu segurança”, diz Fernando Beer, diretor de marketing da Alpargatas. A inclusão na próxima Olimpíada também ajudou. 

Com dinheiro, a confederação pôde bancar passagens e estadia para os times no campeonato brasileiro. O número de equipes registradas passou de 70 para 115. Em 2011, a final e a semifinal passaram a ser transmitidas pelo canal SporTV, com audiência estimada em 1 milhão de espectadores.

Naquele ano, a seleção venceu pela primeira vez a Argentina, uma das potências do esporte, num torneio regional, por 7 a zero — o jogo, diga-se, não era na versão completa, com 15 jogadores, mas num formato reduzido, conhecido como seven.

Ainda há, claro, muito a fazer. Até hoje os times não conseguem pagar salário aos jogadores, que têm de se bancar. E a remuneração dos jogadores da seleção não passa dos 3 350 reais por mês.

Fortalecer a formação de atletas e ter uma liga forte de clubes é o que a Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) fez a partir dos anos 70. Hoje, a CBV arrecada 80 milhões de reais por ano, tem uma liga forte e ajudou a consolidar o Brasil como potência mundial. A ideia é que o rúgbi trilhe o mesmo caminho.

“O patamar do esporte começa a mudar”, afirma Maria Paula da Silva, a Magic Paula, que, a convite de Arap, se tornou membro independente do conselho. Pelo menos comprar a própria camisa e viajar de ônibus para jogar pela seleção são percalços que definitivamente ficaram para trás.

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