Revista Exame

Empresas buscam soluções criativas para manter cultura entre funcionários

Como as empresas encontraram soluções criativas para manter valores vivos entre os funcionários nas incertezas da pandemia e, agora, com as muitas possibilidades do trabalho híbrido

 (Ricardo Davino/Exame)

(Ricardo Davino/Exame)

IBM — Criar o hábito de aprendizado contínuo nos funcionários 

Poucas empresas se adaptaram a tantas mudanças quanto a IBM. A companhia surgiu no início do século 20 para fabricar formulários e cartões de ponto. Depois, nos anos 1950, foi pioneira nos mainframes, grandes computadores para processar folhas de pagamentos. Na década de 1970, a IBM apostou nos microcomputadores. E, nos anos 2000, vendeu a divisão de hardware para focar os softwares, antecipando a computação em nuvem.

Hoje, está com os dois pés na inteligência artificial. É dela o Watson, supercomputador capaz de aprender sozinho. “Num mundo em transformação, a mentalidade de aprendizado contínuo é fundamental”, diz Christiane Berlinck, VP de recursos humanos da IBM Brasil.

Os funcionários da IBM acessam um site interno com lições sobre o dia a dia da operação e competências comportamentais, as chamadas soft skills. Eles também têm acesso a programas de MBA feitos sob demanda pela Fundação Dom Cabral e a cursos online de edtechs, como Coursera e Udemy, e de instituições renomadas, como as universidades Cornell e Harvard, nos Estados Unidos. Em 2020, foram registradas 1,5 milhão de horas de aprendizado no Brasil, 30% mais do que em 2019.

Rodrigo Caetano


Nubank — Usar o layout do escritório como vitrine dos valores 

Os elevadores da sede do Nubank, na zona oeste de São Paulo, são notoriamente lentos. “Para transformá-los num espaço de relacionamento dos ‘nubankers’, colocamos um trilha sonora com música e um pouco de humor”, diz Renee Mauldin, chefe do RH do banco digital, onde o espaço físico serve de vitrine da cultura do negócio. Hoje um negócio com 40 milhões de clientes e 4.000 funcionários, o Nubank nomeou as salas do escritório em homenagem a locais e personalidades do início da empresa.

Uma sala é a Califórnia, em referência à rua onde a empresa foi fundada, em 2014. Outra é a Brigadeiro, sede do segundo escritório. Há ainda a Geladeira, em referência ao frio de uma das primeiras salas, causado por um ar-condicionado mal regulado, e a Galhardo, uma homenagem ao boteco de mesmo nome frequentado pelos primeiros funcionários.

Na pandemia, ter valores bem definidos foi fundamental. O número de clientes do Nubank praticamente dobrou em 2020. Parte disso veio com a digitalização na marra promovida pelo isolamento. Outra parte foi mérito de uma cultura preparada para agarrar a oportunidade.

Rodrigo Caetano


Magalu — Manter uma rotina de encontros 

Na varejista Magazine Luiza, todas as manhãs de segunda-feira são dedicadas ao Rito de Comunhão, um encontro da direção da empresa com os funcionários para discussão de metas e planos. Criado ainda na gestão da empresária Luiza Helena Trajano, que passou o bastão de CEO do Magalu ao filho Frederico em 2016, o encontro foi adaptado aos tempos de pandemia. As rodas de conversa na sede da empresa, fundada em Franca, no interior paulista, deram lugar a videoconferências abertas para a empresa inteira.

Tudo isso em nome de manter o engajamento no meio do isolamento social, um período particularmente duro para o Magalu — a varejista foi uma das primeiras a fechar lojas e focar o e-commerce para minimizar o risco de contágio entre funcionários. “Todos os nossos processos de gestão foram profundamente afetados pelo isolamento social”, diz a diretora executiva de pessoas Patricia Pugas. “Não havia referência, e redesenhar tantas camadas nos fez aprender que o contato faz a diferença.” Medidas de impacto social, como um programa de trainee 100% para negros e a concessão de bolsas de estudo a mulheres desenvolvedoras de softwares, ambas em 2020, colaboraram para fortalecer o orgulho dos funcionários, diz Pugas.

André Lopes


Dennis Herszkowicz, CEO da Totvs: “Tratamos todos como adultos. Pode parecer uma coisa óbvia, mas a maior parte das empresas tem dificuldade com isso” (Germano Lüders/Exame)

Totvs — Descentralizar a tomada de decisão 

Ao ser contratada como VP de pessoas na desenvolvedora de softwares Totvs, em 2019, Izabel Branco teve uma lição de cultura ouvindo um estagiário. Ao perguntar-lhe sobre a melhor coisa da empresa, ouviu dele: “Autonomia total”. “Estagiário com autonomia? Ou tem algo muito certo ou muito errado aqui”, pensou.

Ao que tudo indica, o primeiro cenário é o correto. A receita no segundo trimestre de 2021, de 763 milhões de reais, cresceu 22% na comparação anual. A satisfação de clientes, medida pelo NPS, é recorde. Nos últimos anos, a Totvs saiu comprando concorrentes. Hoje são 25 empresas — a aquisição mais recente, da plataforma de marketing RD Station, em março, saiu por 1,8 bilhão de reais.

A gestão de números superlativos da Totvs (expressão em latim traduzida como “tudo ou todos”) segue a lógica de uma expressão também do latim: divide et impera, ou “dividir a gestão para reinar”. Na prática, o RH faz isso com outro lema, agora do inglês: fix, flex e free. Na parte fix estão os valores inegociáveis da cultura. Na flex entram rituais e pesquisas de RH para medir o clima. E a free é a liberdade do gestor na ponta. “Tratamos todos como adultos. Pode parecer uma coisa óbvia, mas a maior parte das empresas tem dificuldade com isso”, diz o CEO Dennis Herszkowicz.

Luísa Granato


Mercado Livre — Colocar robôs virtuais para avaliar engajamento 

O gigante do comércio eletrônico Mercado Livre está contratando adoidado no Brasil. Em janeiro do ano passado eram 2.600 funcionários. Veio a pandemia, o boom do e-commerce, e hoje o Mercado Livre emprega 10.000 pessoas. Até o fim do ano, outras 6.000 contratações deverão sair do papel. Como manter um negócio coeso com tanta gente chegando?

A saída foi colocar um robozinho virtual para conversar com os novatos em busca de pistas sobre como anda a relação deles com a empresa — e, assim, aumentar as chances de engajamento. Dessas trocas saiu a constatação de que faltava contato da liderança com os recém-chegados no home office. Daí começou um projeto de visitas virtuais de líderes seniores, uma rotina de chamadas de vídeo com gente mais experiente na casa e os recém-chegados. “É uma maneira de manter os funcionários instigados pela cultura da empresa, mesmo de casa”, diz Patrícia Monteiro Araújo, diretora de RH do gigante do e-commerce, onde 90% dos funcionários dizem ter orgulho de trabalhar.

André Lopes

(Arte/Exame)


Sodexo — Incentivar o onboarding 

Uma diretriz da empresa de benefícios corporativos Sodexo para a liderança é cuidar bem do funcionário novato. Na integração de novos profissionais (etapa chamada de onboarding no jargão do RH), o novato recebe detalhes das unidades de negócio e o que é esperado para ele. “Tudo é feito da maneira mais pessoal possível”, diz Fabiana Galetol, líder do RH.

O home office reforçou a orientação para os chefes passarem bastante tempo com seus contratados até a liga entre eles e a empresa pegar. De 2020 para cá, os recrutamentos aumentaram 50% e as demissões voluntárias caíram 12%.

Maria Clara Dias


iFood — Usar um robô para aumentar o engajamento 

Para o aplicativo de delivery iFood, o engajamento de um profissional depende da combinação de uma remuneração justa e um desafio acertado ao propósito de vida da pessoa. “Se um deles estiver em falta, o prejuízo é certeiro”, diz Gustavo Vitti, VP de pessoas e soluções sustentáveis.

A empresa mede o engajamento em pesquisas curtas semanais e usa um robô na rede social corporativa Slack para os funcionários avaliarem o engajamento de colegas aos valores da empresa. No final, o robô pede um conselho à pessoa sendo avaliada. Feito com inteligência artificial, o sistema tem um “algoritmo ético” para evitar vieses inconscientes. A diferença entre avaliações de homens brancos e mulheres negras, que antes tinham a maior desvantagem, se tornou insignificante.

Luísa Granato


Paschoalotto — Investir numa política agressiva de promoções 

Quase 70% da mão de obra da gestora de relacionamento com clientes Paschoalotto é de jovens de 18 a 24 anos, uma geração conhecida por não parar quieta num emprego. Para segurar a turma, a Paschoalotto investe em promoções internas. Só no primeiro semestre, 500 funcionários mudaram para cargos mais altos (são 13.000 ao todo).

“Das vagas abertas, 80% foram ocupadas por gente da casa”, diz Juliana Dorigo, superintendente de RH. A ambição ajudou as finanças. Em 2021, a receita da Paschoalotto deverá crescer 15% sobre 2020, quando faturou 602 milhões de reais.

Gilson Garrett Jr.


Vibra Energia — Validar a cultura com todo mundo 

Como mudar a cultura de uma empresa privatizada? No caso da BR Distribuidora, até o nome foi alterado: em agosto, a empresa virou Vibra Energia. O processo está sendo tocado pelo CEO Wilson Ferreira Jr., executivo tarimbado nesse trabalho. Até abril, Ferreira Jr. presidiu a estatal Eletrobras, onde tocou sinergias entre centenas de negócios da holding. O jeito foi ouvir todo mundo — clientes, especialistas, fornecedores e funcionários.

“Compartilhamos um diagnóstico com a liderança da empresa para ela dividir com as equipes”, diz Ferreira Jr. Tudo validado, a Vibra tirou do papel os pedidos mapeados: um programa de bônus, melhorias no plano de saúde e nos programas de formação de liderança. No segundo trimestre de 2021, a Vibra lucrou 382 milhões de reais, o dobro na comparação anual. Para Ferreira Jr., o resultado é mérito da nova cultura.

Gabriel Aguiar


Algar — Atrelar a cultura às metas 

O grupo Algar tem um jeito de tornar mais concreta a conversa sobre cultura organizacional: o tema virou uma meta cobrada na avaliação anual de desempenho dos funcionários. “Somos uma organização quase centenária, com resultados robustos, mas conscientes de que a cultura que nos trouxe até aqui não será a mesma que nos levará adiante”, diz a VP de RH Eliane Garcia Melgaço. “Foi importante termos métricas e indicadores objetivos.”

Gabriel Aguiar

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