Revista Exame

O que o China Construction Bank quer com o Brasil?

Após dois anos de tentativas, o China Construction Bank enfim compra uma instituição brasileira — o BicBanco — e dá início a seu plano de expansão no país. Mas que plano é esse?

Funcionária do China Construction Bank: do renminbi ao real (Xu Jingbai /Imagine China/AFP Photo)

Funcionária do China Construction Bank: do renminbi ao real (Xu Jingbai /Imagine China/AFP Photo)

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Da Redação

Publicado em 18 de novembro de 2013 às 05h00.

São Paulo - Em meio a bandeirinhas do Brasil e da China, cerca de 30 advogados, banqueiros e assessores brasileiros e chineses reuniram-se no dia 31 de outubro na sede do escritório de advocacia Souza Cescon, na zona oeste da cidade de São Paulo, para finalizar a operação Horizonte.

Após discursos e apresentações em mandarim e português, foi dado o passo decisivo para a entrada do China Construction Bank (CCB) no Brasil. Por 1,6 bilhão de reais, o segundo maior banco comercial da China assinou o contrato de compra de 72% do Banco Industrial e Comercial (BicBanco), controlado pela família Bezerra de Menezes.

A operação, sujeita à aprovação do Banco Central e da presidente Dilma Rousseff, é a primeira aquisição do CCB fora da Ásia. A aquisição foi o ápice de uma estratégia que começou a ser desenhada há dois anos.

A primeira investida foi feita em 2011, quando executivos do CCB contrataram o banco BTG Pactual para encontrar um alvo no Brasil. As conversas evoluíram com a subsidiária do banco alemão WestLB, que também era assediada pelo japonês Mizuho. Em maio de 2012, as duas partes concluíram a auditoria, redigiram o contrato e definiram o valor a ser pago.

Faltava a autorização do Banco Central — que preferiu passar o WestLB aos japoneses. Os motivos não foram divulgados. EXAME apurou que o Banco Central deu um troco nos chineses por causa das dificuldades que o Banco do Brasil enfrentava para atuar no varejo chinês. O BC não comenta.

Os chineses não se abalaram. O passo seguinte foi procurar o Fundo Garantidor de Créditos (FGC), entidade privada que garante a poupança dos correntistas e que contava com uma respeitável lista de bancos quebrados entre seus associados. O FGC ofereceu 200 milhões de dólares pelo liquidado banco Prosper, que pertencia, por sua vez, ao também liquidado Cruzeiro do Sul.

Os chineses acharam o negócio arriscado demais. Neste ano, contrataram o banco Morgan Stanley para encontrar um novo alvo. As conversas com o BicBanco começaram há quatro meses. O Bic vinha sofrendo com a concorrência dos grandes bancos na concessão de crédito comercial para pequenas e médias empresas e tinha dificuldade de captação. 

No primeiro semestre, o banco fundado em 1938 e presidido por José Bezerra de Menezes teve queda de 85% no lucro contábil e perdeu um terço do valor de mercado. No mesmo período, demitiu 160 funcionários, 17% do total. Em setembro, foi multado em 200 000 reais pelo BC por estar em desacordo com as práticas de boa gestão. Notícias sobre uma possível venda começaram a circular. 

Aval do governo

Era o alvo perfeito para os chineses, mas faltava o aval do governo. As negociações se estenderam ao longo de outubro. O ex-presidente do Banco do Brasil, Cássio Casseb, atual consultor sênior do Morgan Stanley no Brasil, ajudou a preparar a apresentação do plano de negócios ao BC.


Um dia antes de assinar o contrato, uma comitiva do CCB e do BicBanco foi a Brasília se reunir com o diretor de organização do sistema financeiro do BC, Sidnei Corrêa Marques. Dessa vez, o BC sinalizou que aprovaria o negócio.

“Foi uma solução que alinhou vários interesses: o BicBanco estava atrás de um comprador, o CCB queria entrar no Brasil e o BB tinha avançado na autorização para abrir a primeira agência brasileira na China”, diz um executivo próximo às negociações. O CCB, o Bic e os envolvidos na operação não quiseram comentar.

Por que o CCB faz questão de entrar no Brasil? Criado em 1954 pelo governo chinês para administrar e distribuir fundos de investimento em infraestrutura e construção, o CCB, presidido por Jianguo Zhang, é o nono maior banco do mundo em ativos, com 5,1 trilhões de reais — 300 vezes maior do que o Bic. Na bolsa, equivale à soma de Banco do Brasil, Bradesco e Itaú.

Apesar de ter escritório em 14 países, o CCB não tinha feito aquisições fora da Ásia. A compra do Bic é parte de uma estratégia de investimentos internacionais de 16 bilhões de dólares. Essa expansão agressiva tem a ver com dois fatores. O primeiro é o momento do sistema financeiro chinês, que sofre com o aumento da inadimplência e a queda nos resultados.

Avançar em diferentes paí­ses é uma forma de diversificar o risco e expandir a carteira de crédito. O CCB também corre para abrir vantagem em relação a seus rivais chineses, numa competição incentivada pelo próprio governo. O Brasil é um dos palcos dessa disputa. O ICBC, maior banco do mundo, conseguiu autorização do BC em agosto de 2012 para abrir agências no Brasil, e o Banco da China está aqui desde 2010.

Se a compra do BicBanco for de fato aprovada, o CCB chegará ao Brasil com uma estrutura maior do que a dos concorrentes. O Bic é o 23o maior em ativos no país, enquanto o Banco da China é o 99o. Isso colocaria o CCB numa posição de destaque para oferecer financiamentos a empresas chinesas que avançam no mercado brasileiro, como a petrolífera Sinopec, sócia da Petrobras no campo de Libra.

A estratégia do CCB é financiar também companhias brasileiras que exportam para a China. É muito dinheiro em jogo. De 2007 a 2012, foram iniciados 60 projetos de empresas chinesas no Brasil, com 68,5 bilhões de dólares de investimentos. O CCB também estuda incluir no portfólio do BicBanco linhas de crédito imobiliário, um ramo em que é líder na China, e financiamento para obras de infraestrutura. Após tanto trabalho para entrar no Brasil, o CCB não vai se contentar com pouco.

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