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Quem era Alexei Navalny, opositor de Putin morto na prisão

Segundo Serviço Penitenciário Federal, ele teria passado mal após uma caminhada e perdido a consciência 'quase imediatamente'

O mais ferrenho opositor de Putin fez uma aposta alta ao regressar a Moscou após ter sido envenenado, em agosto de 2020 (Simonovsky District Court/Handout/Reuters)

O mais ferrenho opositor de Putin fez uma aposta alta ao regressar a Moscou após ter sido envenenado, em agosto de 2020 (Simonovsky District Court/Handout/Reuters)

Agência o Globo
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Agência de notícias

Publicado em 16 de fevereiro de 2024 às 08h54.

Alexei Navalny, principal opositor do presidente russo Vladimir Putin, morreu aos 47 anos na prisão, informaram as agências locais nesta sexta-feira. Em comunicado, o Serviço Penitenciário Federal afirmou que ele "sentiu-se mal após uma caminhada, perdendo quase imediatamente a consciência". Médicos da instituição teriam sido chamados, e "todas as medidas de reanimação necessárias foram realizadas, mas não tiveram resultados positivos". O órgão afirmou que as causas da morte estão sendo apuradas.

Quando soube que foi sentenciado a dois anos e oito meses de prisão em regime fechado, em 2021, Navalny olhou para sua esposa, Yulia, e disse que "tudo ficaria bem". O mais ferrenho opositor de Putin fez uma aposta alta ao regressar a Moscou após ter sido envenenado, em agosto de 2020, e passado por um tratamento na Alemanha. Sua prisão era esperada, mas a iminência de seu desaparecimento da vida pública jogou o movimento oposicionista russo — e mesmo o governo — em um terreno desconhecido.

Ao contrário de outras figuras que dominam a política russa, Navalny não possuía laços com oligarquias ou famílias tradicionais, nem fez sua base nos tempos da União Soviética. Nascido nos arredores de Moscou e filho de pequenos empresários, ele passou alguns verões na Ucrânia, de onde vinha parte de sua família e onde aprendeu o idioma local. No final dos anos 1990, formou-se em Direito na Universidade Russa da Amizade dos Povos, instituição criada nos anos 1960 e que teve entre seus alunos o líder palestino Mahmoud Abbas e o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega. Navalny possuía ainda formação em finanças, um conhecimento que se mostrou útil em suas incursões no ativismo político.

Alexei Navalny fez seu nome ao expor a corrupção oficial, rotulando a Rússia Unida, legenda de Putin, como “o partido dos vigaristas e ladrões”. Em 2006, começou a escrever um blog sobre corrupção focado nas grandes corporações que comandavam a economia russa. Em vez de se basear em denúncias anônimas, utilizou uma estratégia pouco usual: investiu 300 mil rublos (o equivalente na época a R$ 21 mil) em ações de empresas do setor petrolífero. Assim, pressionava pela liberação dos números das operações e tinha acesso a informações que usaria em suas postagens.

Um dos casos mais emblemáticos foi a denúncia de um desvio de US$ 4 bilhões na operadora de oleodutos Transneft, ocorrido em 2007 e revelado por Navalny em 2010. Apesar da documentação, o caso, que chegou ao conhecimento de Vladimir Putin, não resultou em condenações ou popularidade positiva.

— Esse lado financeiro dele teve um impacto mais negativo que positivo — declarou ao GLOBO Angelo Segrillo, professor de história na Universidade de São Paulo (USP). — Ele foi acusado de querer ganhar dinheiro com essa estratégia.

Em outra frente, criou um projeto conhecido como RosYama, em que os cidadãos reportavam buracos de rua e pressionavam as autoridades para que os tapassem. Nessa mesma época surgiu a Fundação Anticorrupção, que se tornaria sua principal fachada política. “O foco na corrupção foi algo grande, uma vez que é ali que Putin sente mais a pressão. E ele fez algo fora dos meios políticos tradicionais, em um momento em que a maior parte da oposição estava desacreditada”, declarou Segrillo.

Apesar de ser considerado a “face da oposição” na Rússia pelo Ocidente, Navalny não seguiu a esperada cartilha internacionalista e liberal. A começar pela forma como se definia, um nacionalista democrata. Em diversas ocasiões, foi acusado de se aliar a grupos extremistas. Em 2008, criou uma plataforma chamada O Povo, que trazia entre suas prioridades a “defesa dos russos étnicos” e chegou a se unir a grupos anti-imigração. Anos mais tarde, tentou se afastar do radicalismo, no que o professor Segrillo chamou de “nacionalismo light”, uma defesa dos ideais nacionais, além de manter um distanciamento calculado do Ocidente. Um exemplo disso é sua defesa da manutenção da Crimeia como parte da Rússia após a anexação, em 2014.

— Na Rússia muitos têm um pé atrás com o Ocidente. Navalny sabia que ficaria queimado se focasse nessa pauta. Por isso preferiu se concentrar em dois grandes pontos, a questão da corrupção, que lhe deu destaque, e o nacionalismo ‘light’, que atraiu pessoas que são contra Putin mas não próximas ideologicamente dele — apontou Segrillo.

Um dos pontos que mais definiam Navalny era a forma como ele usava as redes sociais para se comunicar. Ali, o ativista adotou o que Alexey Sakhin definiu, em um artigo na revista Jacobin, como “social-populismo”, que usa a bandeira da luta contra a corrupção para angariar apoio e denunciar desigualdades, mas sem avançar em pautas reformistas. “Ele não discute mais a ineficiência do Estado, mas sim a desigualdade social. Compara os luxos dos oligarcas russos e funcionários do governo com a pobreza das pessoas comuns”, escreveu Sakhin.

Navalny tentou capitalizar politicamente esse prestígio. Em 2011, foi um dos responsáveis pelos protestos que questionavam a lisura das eleições legislativas daquele ano. Chegou a ser preso e foi liberado logo depois, mas sacramentou seu papel na oposição, muito embora as pesquisas mostrassem que apenas cerca de 5% dos russos o conheciam.

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