Brasil

Crédito consignado do Auxílio Brasil atrasa e pode levar até 15 dias

A Caixa justificou que há um "excesso de solicitações" que ocasionou "lentidão nos processamentos", mas afirmou que a liberação do crédito se dará no máximo em cinco dias

Auxilio Brasil: o Idec recebeu relatos de beneficiários para quem o dinheiro do empréstimo foi prometido apenas para dezembro (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

Auxilio Brasil: o Idec recebeu relatos de beneficiários para quem o dinheiro do empréstimo foi prometido apenas para dezembro (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 21 de outubro de 2022 às 18h52.

Última atualização em 21 de outubro de 2022 às 19h33.

Num movimento atípico, famílias de baixa renda que recebem Auxílio Brasil foram informadas pela Caixa de que o dinheiro do consignado que contrataram poderá ser depositado depois das eleições. O prazo inicial era de 48 horas, mas nesta semana o banco informou que o dinheiro só deverá cair na conta em até 15 dias.

Ao Estadão, a Caixa justificou que há um "excesso de solicitações" que ocasionou "lentidão nos processamentos", mas afirmou que a liberação do crédito se dá no máximo em cinco dias. A reportagem, contudo, teve acesso a mensagens enviadas pelos bancos aos clientes nas quais informa que o "crédito ocorre entre 2 e 15 dias".

O Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) recebeu relatos de beneficiários para quem o dinheiro do empréstimo foi prometido apenas para dezembro.

Jenifer Kauane Batista contratou o consignado do Auxílio Brasil pela Caixa na terça-feira, dia 11, logo no primeiro dia em que estava disponível nas lotéricas. Dois dias depois, o empréstimo foi aprovado, e ela foi informada de que o dinheiro seria liberado em 48 horas.

Como a transferência não foi feita, ela ligou para o SAC do banco e a atendente deu uma outra informação: de que o prazo, na verdade, era de cinco dias. Ontem porém, ao checar o aplicativo do banco, o pedido que antes constava como "aprovado" havia voltado para o status "em processamento".

"Tentei ligar no SAC novamente, mas não atendem. Também estou tentando falar no WhatsApp da Caixa, mas só dá erro. Não sei mais o que eu faço", conta ela, que mora em Paranaguá (PR) com o marido e o filho de dois anos. Jenifer contratou um empréstimo de R$ 2,3 mil.

Além da queixa geral, há muita desinformação nas redes sociais em torno do Auxílio Brasil. O Estadão acompanhou a movimentação de sete grupos de beneficiários do programa no WhatsApp, Facebook e no Telegram. O clima das mensagens é um misto de indignação e revolta de quem ainda não conseguiu receber o dinheiro mesmo depois da contratação da operação e de insegurança com uma enxurrada de fake news em torno do crédito consignado.

O Idec vem monitorando reclamações nas redes sociais sobre o consignado do Auxílio Brasil. Nos últimos dias, a instituição notou um aumento expressivo no número de queixas sobre o atraso no pagamento. O atraso na liberação do dinheiro no período eleitoral tem gerado dúvidas nos beneficiários do programa.

"Muitos perguntaram se o Lula ganhar a eleição o consignado será suspenso", relata a diretora institucional da Rede Brasileira de Renda Básica, Paola Carvalho, uma rede de apoio aos vulneráveis. Segundo ela, essas dúvidas estão se espalhando dentro de grupos dos beneficiários.

Quer receber os fatos mais relevantes do Brasil e do mundo direto no seu e-mail toda manhã? Clique aqui e cadastre-se na newsletter gratuita EXAME Desperta.

Seguro e taxas de até R$ 200

Além de juros de 50% ao ano no consignado do Auxílio Brasil — acima da média das taxas cobradas para outros segmentos —, usuários que contrataram o crédito se depararam com outras cobranças sobre as quais não sabiam no extrato do empréstimo, como juros de acerto e seguro prestamista.

Midiã Jacinto Almeida, da cidade mineira de Campanha, teve o empréstimo aprovado na segunda-feira, 17, e, passadas mais de 48 horas, não havia recebido o dinheiro nem conseguia informações.

Ela e o marido, Ezequiel Duarte, pediram o empréstimo numa casa lotérica e não foram informados de outros custos, como seguro prestamista e juro de acerto. A família teve autorizado um empréstimo de R$ 2.582,88 e receberá R$ 2.379,87 líquidos, com custo efetivo total de 59,78% ao ano.

Além do IOF de R$ 75,55 (2 925%), foram cobrados o valor do seguro de R$ 65,08 e o do juro de acerto, de R$ 62,38. "No momento em que eu fiz, ninguém falou sobre esse seguro", disse.

Segundo ela, o atraso no pagamento é o caso dela e de muitos outros beneficiários do programa. "Eu tenho um grupo no WhatsApp e no Facebook, e lá são vários depoimentos de pessoas que não estão conseguindo (receber o dinheiro)."

Para o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), a cobrança dessas taxas é abusiva.

"Os juros de acerto são uma prática frequente dos bancos, quando aumentam o prazo de início de pagamento em mais de 30 dias. Essa condição encarece o crédito, pois o banco corrige o valor pelo tempo adicional que foi proposto", explica Ione Amorim, coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Idec.

"Mas a Portaria 816/22, do Ministério da Cidadania, veda a ampliação para início de pagamento. Como não pode ser repassado nas parcelas por conta do teto da margem de 40%, incide na redução do valor liberado ao beneficiário, mais um abuso", avalia.

Já o seguro prestamista, informa o Idec, é uma garantia em caso de inadimplência, morte ou invalidez. No caso do crédito consignado, o desconto é direto no benefício; então, o risco de inadimplência só ocorre no caso de saída do programa. "Essa é uma condição opcional que, nesse caso, nem deveria ser oferecida pois encarece ainda mais o crédito, que já tem uma taxa de juros elevada", diz Ione. "Ao impor a contratação do seguro sem consulta prévia ou impor a cobrança para liberar o crédito, o banco está descumprindo o Código de Defesa do Consumidor", diz.

O Idec elaborou uma nota técnica em que endossa o pedido feito pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) para a suspensão da oferta do crédito consignado para beneficiários do Auxílio Brasil. A entidade aponta possíveis riscos para os beneficiários e uso do serviço para fins eleitorais.

Questionada sobre as taxas adicionais no empréstimo, a Caixa não se manifestou.

Informações truncadas

Nos grupos de Facebook e WhatsApp aos quais o Estadão teve acesso, há uma avalanche de reclamações de atraso no pagamento do dinheiro. Beneficiários relatam que a Caixa já fala em 15 dias de prazo para o recebimento do crédito, sendo que o prazo informado inicialmente era de 48 horas após a aprovação.

Em uma das mensagens compartilhadas, a Caixa diz a uma beneficiária por WhatsApp que "nesta semana o sistema da Dataprev está congestionado, atrasando o crédito". Uma outra participante relatou ter sido informada de que só teria acesso ao crédito a partir de 10 de novembro, daqui a três semanas.

Há ainda muitos relatos de cancelamento do benefício — sobretudo de pessoas que contrataram o consignado nos primeiros dias da modalidade, 10 e 11 deste mês. O empréstimo, que aparecia como "aprovado" ou "em processamento", agora aparece como cancelado, sem explicações.

Segundo a Caixa, quando a solicitação apresenta status de "em processamento" há mais de dois dias ou "cancelado" "os beneficiários podem realizar nova solicitação diretamente no Caixa Tem ou nas unidades lotéricas e agências". Segundo o banco das 700 mil contratações da modalidade até agora, que totalizam R$ 1,8 bilhão, "já foram creditados aproximadamente 80%".

O consignado do Auxílio tem juro de 3,45% ao mês, beirando o limite de 3,5% estabelecido pelo Ministério da Cidadania. A prestação máxima é de 40% do valor do Auxílio Brasil; já a parcela mínima é de R$ 15 reais. A duração do empréstimo é de até 24 meses.

LEIA TAMBÉM:

MP junto ao TCU pede suspensão de concessão de consignado do Auxílio pela Caixa

Ministério da Cidadania prorroga por 30 dias prazo para atualização do Cadastro Único

Acompanhe tudo sobre:Auxílio BrasilCaixaIdec

Mais de Brasil

Previsão do tempo: RS volta a enfrentar chuvas e geadas; temperaturas no Sudeste serão mais amenas

Governo do RS convoca policiais e bombeiros aposentados 'para reforçar estruturas de segurança'

Prefeito diz que "não há imóveis disponíveis" em Porto Alegre para tantos desabrigados

Julgamento no TSE que pode cassar mandato de Moro acontece nesta quinta; assista ao vivo

Mais na Exame